Por:
Ilo Jorge de Souza Pereira
Especialista
em Gestão Pública e Política.
O QUE É? E QUAL A UTILIDADE DA DRU -
DESVINCULAÇÃO DE RECEITAS DA UNIÃO?
A desvinculação de receitas da União
(DRU) foi adotada em 1994, quando da implementação do Plano Real. Os seus
objetivos principais são:
a) aumentar a flexibilidade para que o
governo use os recursos do orçamento nas despesas que considerar de maior
prioridade;
b) permitir a geração de superávit nas
contas do governo, elemento fundamental para ajudar a controlar a inflação.
A necessidade de criação da DRU decorre de algumas regras estipuladas pela Constituição. A primeira delas é a divisão do orçamento do Governo Federal em duas partes: o orçamento fiscal e o orçamento da seguridade social.
A seguridade social compreende as atividades do governo nas áreas de saúde, assistência social e previdência social. As demais áreas têm seus gastos programados no orçamento fiscal. Além de segmentar o orçamento em duas partes, a Constituição também segmentou as receitas que deveriam financiar cada um dos orçamentos. Para o orçamento da seguridade foram reservadas as chamadas “contribuições sociais”, que são tributos que incidem, principalmente, sobre a folha de pagamento das empresas, o lucro, o faturamento ou a receita.
São exemplos dessas contribuições: as
contribuições para a previdência social, COFINS, CSLL e a extinta CPMF.
Para o orçamento fiscal ficaram os
impostos tradicionais, como os impostos sobre renda, sobre produtos
industrializados, sobre exportação e importação, as taxas e as contribuições
econômicas como a Cide - Combustíveis.
Ocorre que a Constituição também
determinou que a maioria dos impostos deve ter sua receita repartida com os
estados e municípios, enquanto as contribuições Quando o Governo Federal se viu
na necessidade de elevar a arrecadação para promover uma redução do déficit
público e poder pagar a elevada dívida pública, ele percebeu que estava em um
beco sem saída.
Se elevasse os impostos, parte da
receita arrecadada teria que ser dividida com estados e municípios, de modo que
restaria apenas em torno de 50% da receita adicional nos cofres da União. Se
elevasse as contribuições sociais, estas teriam que ser direcionadas para os
gastos com saúde, assistência social e previdência, não havendo a possibilidade
de se carrear a nova receita para o pagamento da dívida pública.
Foi aí que se criou a DRU, que nada mais
é do que uma regra que estipula que 20% das receitas da União ficariam
provisoriamente desvinculadas das destinações fixadas na Constituição. Com essa
regra, 20% das receitas de contribuições sociais não precisariam ser gastas nas
áreas de saúde, assistência social ou previdência social. Isso abriu um caminho para que o Governo
Federal promovesse forte elevação da tributação via contribuições sociais, que
não precisavam ser divididas com estados e municípios e, graças à DRU, poderiam
ser usadas para pagamento da dívida pública ou pagamento de outras despesas
fora do orçamento da seguridade social. De fato, a partir da introdução da DRU
em 1994, podemos notar um crescimento da carga tributária, em sua maior parte
decorrente da criação ou majoração das contribuições sociais.
A receita de impostos e taxas,
integrante do orçamento fiscal, manteve-se no patamar de 6 a 8% do Produto Interno
Bruto (PIB); já a receita de contribuições, em sua maior parte integrante do
orçamento da seguridade social, passou de 8,1% do PIB, em 1995, para 12,9% em
2010.
A DRU trazia também outra vantagem. A
Constituição não criou apenas a vinculação entre as receitas de contribuição e
o orçamento da seguridade. Existe um grande número de outras vinculações. Por
exemplo: os recursos arrecadados pelo PIS/PASEP devem ser entregues ao Fundo de
Amparo ao Trabalhador (FAT), 18% da receita de impostos devem ser gastas em
manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE), as taxas cobradas por órgãos
públicos em geral são vinculadas ao financiamento das despesas desses órgãos (por
exemplo: taxa de serviços aeroportuários devem financiar o custeio da
Infraero).
As vinculações de receitas, somadas a
gastos em boa medida incompressíveis – despesas com pessoal, benefícios
previdenciários, serviço da dívida etc., dificultam a capacidade de o governo
federal alocar recursos de acordo com suas prioridades sem trazer endividamento
adicional para a União).
Com a DRU, 20% das vinculações caíam por
terra e o Governo ganhava mais flexibilidade para usar os recursos nas
finalidades que considerasse necessárias. O mecanismo, que era para ser
provisório, foi renovado diversas vezes.
Contudo, como veremos adiante, a sua importância foi se reduzindo ao
longo do tempo. Primeiro, porque as despesas da seguridade social, em especial
da saúde e da previdência, cresceram fortemente. As despesas da previdência
aumentaram muito devido aos seguidos reajustes do salário mínimo acima da
inflação.
Como o salário mínimo é referência para
os benefícios previdenciários, a despesa da previdência cresceu muito as
despesas com saúde cresceram devido à regra instituída pela Emenda
Constitucional nº 29, de 2000, que determinou que o gasto da saúde deve crescer
no mesmo ritmo de crescimento do PIB. Como o PIB cresce acima da inflação, as
despesas com saúde acompanham esse ritmo.
Se esses dois setores passaram a
demandar cada vez mais dinheiro, passaram a sobrar menos recursos de contribuições
sociais para serem remanejados para o pagamento de outras despesas e a
amortização da dívida pública. Outro fator que enfraqueceu o poder da DRU de
gerar recursos para livre alocação é o exercício de pressão por parte dos
grupos que se consideram prejudicada pelo mecanismo.
A cada renovação da DRU a sua
abrangência torna-se mais restrita.
FUNDAMENTO LEGAL
O mecanismo foi criado em 1994, com o
nome de Fundo Social de Emergência (FSE). Desde então, esse instrumento foi
prorrogado, com algumas alterações, com o nome de Fundo de Estabilização Fiscal
(FEF) e, atualmente, Desvinculação de Receitas da União (DRU). Em 2007, foi aprovada
pelo Congresso Nacional sua prorrogação, até 31 de dezembro de 2011, pela
Emenda Constitucional (EC) nº 56, de 20 de dezembro de 2007.
O fundamento legal da DRU, atualmente em
vigor, é a Emenda Constitucional nº 56, de 2007, que a prorrogou nos mesmos
termos da EC nº 42, de 2003. O dispositivo desvinculou de órgão, fundo ou
despesa, até 31 de dezembro de 2011, 20% da arrecadação de impostos,
contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou
que vierem a ser criados, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.
Em 2011 o Poder Executivo encaminhou a
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 61, de 8 de junho de 2011,
prorrogando mais uma vez a DRU, desta vez até 31 de dezembro de 2015. A
proposta mantém a atual redação do art. 76 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, apenas prorrogando o seu prazo e atualizando a
sua redação.
Comparando-se o texto atual da DRU com
aquele vigente na sua primeira versão (FSE de 1994) percebe-se que foram
excluídos do alcance da DRU as transferências aos estados, ao Distrito Federal
(DF) e aos municípios previstas na Constituição Federal.
Por outro lado, foram incluídas as
contribuições de intervenção no domínio econômico (CIDE) entre as receitas
sujeitas à desvinculação. Com isso, a contribuição incidente sobre combustíveis
(CIDE-Combustíveis) foi desvinculada, resultando em perdas para os estados e
municípios (ou seja, a desvinculação não afeta essas transferências
constitucionais, de forma que estados, DF e municípios, nesses casos, não
sofrem perdas com a DRU como sofriam com o FSE).
Essa perda foi contornada com o aumento
da participação dos governos subnacionais de 25% para 29% da receita da CIDE,
por força da Emenda Constitucional nº 44, de 2004.
A versão atual da DRU também exclui da
desvinculação a contribuição social do salário-educação, devida pelas empresas,
ao financiamento do ensino fundamental público.
Em relação à desvinculação de recursos
para a manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE), a Emenda Constitucional nº
59, de 11 de novembro de 2009, determinou a redução progressiva do percentual
da DRU incidente sobre esses recursos. Assim, para efeito do cálculo dos
recursos para MDE, o percentual de desvinculação passou para 12,5%, em 2009,
5%, em 2010, e nulo no exercício de 2011. Portanto, a partir deste ano, a DRU
deixará de afetar as vinculações para MDE e, portanto, não mais implicará
aumento dos recursos de livre alocação decorrente da desvinculação de impostos.
Por fim, as leis de diretrizes
orçamentárias têm ressalvado da desvinculação as contribuições sociais do
trabalhador e do empregador ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e ao
Plano de Seguridade Social dos Servidores Públicos, em observância ao disposto
no inciso XI do art. 167 da Constituição Federal.
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