Especialista em Gestão Pública e Política
Em decorrência de ser a Administração
responsável por cuidar de interesses de que não é titular, visto que são
interesses públicos, todos os responsáveis pela gestão dos recursos públicos
devem estar, a todo momento, preparados para prestar contas a respeito de suas
atividades, especialmente quando estas estão relacionadas com o emprego de
recursos do Erário.
Nesse contexto, a realização das despesas
corresponde a um ponto nodal, no qual é importante registrar que está o
administrador obrigado a demonstrar que empregou recursos públicos com produtos
ou serviços adequados aos fins a que se destinem e que, considerando as
condições do mercado, pagou por ele um preço justo, assegurando, ademais, a
possibilidade de participação de todos os particulares que estejam,
potencialmente, interessados em manter relação contratual com a Administração e
tenham condições de atender às suas necessidades.
Daí surge o procedimento licitatório, como
meio de viabilizar não só que estas metas sejam atingidas, mas também para
assegurar que qualquer interessado possa ter acesso ao conjunto de providências
que foram adotadas com esta finalidade.
A realização de licitações, em nosso sistema
jurídico, corresponde a imperativo consagrado constitucionalmente, conforme
consta do art. 37, XXI da Constituição Federal, que prescreve:
XXI - ressalvados os casos especificados na
legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante
processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os
concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas
as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá
as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações.
A disposição constitucional é bastante ampla,
abrangendo toda sorte de negócios que pode a Administração vir a celebrar com
terceiros, condicionando sua válida celebração à observância estrita do
princípio da igualdade.
Neste pormenor, é importante que seja
rememorado que este princípio não é algo que aparece pela primeira vez no texto
constitucional, mas determinação constante no art. 5.º, posteriormente repisado
como princípio específico da Administração Pública no art. 37 caput, sob a forma de impessoalidade e
posteriormente repisado ao consagrar o constituinte o princípio licitatório.
A repetição é eloquente e deve ser
considerada uma busca pela observância cada vez mais estrita do princípio
conforme há aproximação da atividade administrativa de situações em que este
esteja mais sensível, como no caso das licitações, daí sermos obrigados a
considerar que em seara de licitação haveria uma estritíssima igualdade entre
os potenciais interessados.
Esta determinação do constituinte deve nos
remeter à consideração a respeito do princípio da igualdade, tal como
consagrado em nosso sistema positivo, que implica o tratamento igual aos iguais
e desigual aos desiguais. Todo o sistema jurídico a respeito das licitações
deve ser compreendido a respeito dessa compreensão.
Assim, haverá muitas situações concretas em
que estaremos diante de situações em que, por força de circunstâncias de fato
específicas, possa ser legal ou ilegal determinada providência ou exigência no
âmbito de um procedimento desta natureza, o que decorre de motivo muito
simples: os critérios para aferir as desigualdades devem estar logicamente
vinculados aos objetivos perseguidos em cada caso pela administração.
A aferição deste vínculo lógico reclama a
incidência extremamente forte do princípio da razoabilidade, que será meio
eficaz de identificar eventuais abusos cometidos em nome da preservação da
igualdade.
Estes dados de interesse público relativos às
licitações têm como principal efeito concreto o resguardo dos direitos de
particulares interessados em contratar com a administração – neste pormenor,
intensamente irmanados com o interesse público; entretanto, também há outros
elementos que devem ser observados, ainda que não estejam expressamente
consagrados no texto constitucional, mas que decorrem de modo inequívoco do
regime jurídico a que se vincula a Administração Pública.
Estes dados normativos constam do art. 3.º da
Lei 8.666/93, que traz as normas gerais a respeito das licitações e contratos,
cujo texto determina que seja buscada por meio do procedimento a proposta mais
vantajosa para a Administração, assim entendida aquela que oferecer bens ou
serviços de qualidade adequada associado ao menor valor – importante observar
que não se trata exclusivamente de preço, mas de relação entre custo e
benefício.
Essa determinação legal poderia ser colhida
diretamente da Constituição, considerando-se que dentre aqueles que, em
condição de igualdade, tenham interesse em contratar com a Administração apenas
um, ordinariamente, poderá ser escolhido – é nesse momento, e somente neste,
que surge a possibilidade de proteger de modo direto o interesse secundário da
Administração, por meio da redução dos custos, o que oferece, paralelamente, um
critério objetivo para que se escolha o particular a ser contratado.
Considerando que não há, por questões de
ordem fática ou material, condições de atender a todos estes elementos por meio
de um único ato, falaremos sempre em procedimento licitatório, assim
considerado o conjunto de atos logicamente encadeados, com vistas e
identificação daquele particular com quem a administração deve contratar.
Partindo destes pressupostos é que será
analisado o procedimento licitatório, que nada mais é do que um meio para que
sejam atendidas as disposições normativas acima mencionadas, por meio de
providências que sejam devidamente registradas de modo a permitir que
futuramente seja demonstrado pelo responsável pela compra que os padrões legais
foram adequadamente atendidos.
Importa também registrar que, para além das
normas vazadas pela Constituição, há relevantes disposições na legislação
federal a respeito das licitações, especialmente na Lei nº 8.666/83, que dispõe
sobre as normas gerais para as licitações e contratos, mas também na lei nº 10.520/2002,
que dispõe sobre o pregão e na lei nº
12.462/2011,
que estabelece o regime diferenciado de contratações.
Finalmente, não pode ser perdido de vista que
as compras públicas também podem ser relevante elemento de indução de
determinados setores da economia, razão pela qual há permissivos para que sejam
adotadas práticas que, eventualmente, contradigam a economicidade a fim de
viabilizar a perseguição de outros interesses públicos – como ocorre, por
exemplo, com as pequenas empresas, cujas propostas podem ser escolhidas ainda
que sejam mais onerosas do que aquelas apresentadas por empresas de grande
porte.
1. PLANEJAMENTO E LICITAÇÃO
É imperioso que tenhamos sempre claro que
qualquer compra pública deverá ocorrer com o fim de atender às necessidades
relacionadas a determinada meta a ser perseguida pela administração.
Com efeito, não é demais lembrar que a
autorização para qualquer gasto de recursos públicos depende da observância do
conjunto de normas que determina o ciclo orçamentário (Plano Plurianual – PPA,
Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO e Lei de Orçamento Anual – LOA), às quais
estabelecem metas a serem perseguidas pela Administração e estipula, na sequência,
os recursos que estão vinculados ao cumprimento de cada uma delas.
Assim, as licitações devem ser compreendidas
como a ponta, o elemento final de um processo complexo, visto que determinado
por um conjunto de atos, que viabilizarão o atendimento aos diversos interesses
públicos, por meio do cumprimento das diversas etapas previstas neste conjunto
de normas.
Poderíamos afirmar que partindo da premissa
de que o conjunto de questões que deve a Administração Pública enfrentar é
bastante complexo, a legislação financeira elege as prioridades a serem enfrentadas
com vistas a determinar cada uma das etapas que devem ser resolvidas.
2. PROJETO BÁSICO OU TERMO
DE REFERÊNCIA
Todo procedimento licitatório depende,
inicialmente, da identificação adequada e precisa dos bens ou serviços a serem
adquiridos, quer dizer trata-se de elemento de fundamental importância para a
efetividade do atendimento da demanda administrativa pelo futuro contratado
assim como para viabilizar a adequada atenção ao princípio da igualdade,
conforme demonstraremos a seguir.
A identificação do bem deve assegurar o
resultado pretendido pela contratação – decorrência do princípio da finalidade
e da eficiência – por meio de elementos objetivos que impeçam a oferta de bens
ou serviços de qualidade diversa da necessária, ou, ainda, cujas
características não sejam compatíveis com outros elementos com os quais devam
se relacionar.
A bem da clareza, um exemplo: diversas
pessoas políticas têm adotado posturas ativas em relação ao software livre, ou seja, somente
utilizam programas cujo código seja aberto a qualquer usuário interessado. A
partir desta decisão, há a necessidade de que sejam exigidos de todos e
quaisquer prestadores de serviços na área de tecnologia da informação a
habilidade de lidar com essa espécie de insumo tecnológico.
Com efeito, ainda que os sistemas
proprietários (alternativas ao software livre)
tenham condições de atender à demanda, a orientação anterior da administração e
as aquisições que foram realizadas implicam a necessidade lógica de que exista
uma orientação das futuras aquisições com vistas a assegurar os resultados
pretendidos, a saber: dotar a administração de meios de tecnologia da
informação que viabilizem o cumprimento de suas metas de modernização e incentivar a indústria de programas
não proprietários assim como as empresas habilitadas em prestar serviços com
essa espécie de programas.
Essa circunstância faz com que exista um
delicado equilíbrio a ser observado quando da elaboração desse documento, visto
que a especificação muito aberta ou ainda que seja omissa em qualidades
relevantes para o desenvolvimento do projeto podem levar à contratação de um
bem que não atenda à demanda, o que geraria desperdício de recursos públicos,
ainda que a compra ocorresse por valor compatível com o mercado, visto que a autorização
para qualquer gasto deverá corresponder à determinada meta, que, nessas
condições, fatalmente não seria atendida.
Caso, por outro lado, a especificação seja
exageradamente detalhada, haverá a exclusão indevida de produtos ou serviços
que poderiam adequadamente atender à demanda da Administração Pública,
restringindo de modo indevido o universo de proponentes – o que violaria os
princípios da isonomia, visto que excluiria da licitação interessados com
condições de atender à demanda proposta e da economicidade, visto que a
diminuição das ofertas implica potencial majoração dos preços.
É, com efeito, a partir da descrição precisa dos
encargos que devem ser suportados pelos interessados no contrato, de modo que
possam ser adequadamente formados os preços, e avaliadas as efetivas condições
que sejam necessárias para fazer frente aos encargos contratuais.
Este conjunto de informações deverá partir,
na medida do possível, de estudos técnicos a respeito do objeto a ser
futuramente licitado – no momento da licitação, deverá estar adequadamente
acompanhado de orçamento elaborado pela administração com base em pesquisas de
mercado ou ainda em levantamentos oficiais de preços (tabelas preparadas pela
administração que retratam preços de mercado para conjuntos de produtos ou
serviços).
A toda evidência, estes elementos devem ser
tão mais complexos quanto mais complexa for a futura contratação, mas ainda que
se pretenda adquirir bens simples, como canetas por exemplo, devemos ter uma
descrição completa a respeito do objeto a ser licitado, sem utilizar elementos
que levem à preferência de marca.
Nesse ponto, um exemplo ilustra a
possibilidade de uma especificação que leva a nulidade: em determinada
aquisição de canetas, uma das exigências apresentadas no Edital era que a
caneta fosse esferográfica com ponta de tungstênio. Considerando que o material
em questão não é utilizado por todos os fabricantes deste modelo de caneta, e
que não há dados técnicos que viabilizem a conclusão de que este material
apresenta diferença substancial de qualidade para os fins a que a Administração
destinaria uma caneta, a especificação passa a ser abusiva, e, portanto, nula
para todos os efeitos.
A partir destes elementos, podemos concluir
que a adequada especificação é uma das chaves do sucesso para uma licitação,
pois a partir da especificação dos pontos necessários ao atendimento da
necessidade da administração, o critério ordinário para a escolha das
propostas, como se verá adiante, será o preço, e, uma especificação que permita
a oferta de produtos de qualidade inferior levará, normalmente, a
administração, a adquiri-los, considerando que estes têm, via de regra, o menor
preço também.
Sob o ponto de vista técnico jurídico, é
importante registrar que a descrição imprecisa ou exagerada do objeto é fonte
de nulidade do processo de licitação, e, ademais disso, deverá haver
justificativa adequada para a escolha dos elementos constantes do descritivo
colocado no termo de referência ou projeto básico, a bem do princípio da
motivação.
Aqui, ademais, existe um elemento de suma
importância: os quantitativos. Determinadas aquisição são, em larga medida, de
justificativa evidente, tal como ocorre com material de expediente ou de
limpeza, mas é importante que sejam adequadamente justificados e estimados os
quantitativos de cada um dos bens que se pretende adquirir, com fundamento na
utilização efetivamente verificada em períodos iguais àqueles que se pretende
contratar.
3. ORÇAMENTAÇÃO E
VERIFICAÇÃO DA COMPATIBILIDADE ORÇAMENTÁRIA
A partir da precisa definição dos elementos
que a Administração espera do futuro contrato, é importante verificar quais são
os custos estimados para cada um dos elementos que se pretende contratar.
Importa registrar, nesse pormenor, que os
custos devem ser referentes às menores unidades possíveis da realização da
obra, da prestação dos serviços ou ainda da aquisição a ser realizada, de modo
que fique consignado não apenas os valores globais da compra, mas as parcelas
que levam à sua composição.
Assim, a partir deste conjunto robusto de
elementos, será verificado qual o custo estimado da futura contratação, a fim
de que sejam identificados dois elementos fundamentais ao sucesso da licitação,
a saber: a disponibilidade orçamentária para fazer frente aos custos
decorrentes da futura contratação e a viabilidade de que as empresas atuantes
no mercado ofereçam os bens ou serviços previstos para a futura contratação.
Importante registrar, em relação aos custos e
elementos relativos ao orçamento, que deverá ser estimado o valor da futura
contratação de acordo com a média das propostas apresentadas no processo ou
ainda com preços que representem a média dos preços para os itens que se
pretende contratar.
A adoção do menor preço constante de cotação
realizada como parâmetro para a realização destes atos poderá implicar severos
problemas relacionados a encaminhamento da licitação, especialmente quanto à
disponibilidade de recursos – fique registrado que não é obrigatório que as
empresas que apresentaram preços para efeito de cotação participem,
posteriormente, do certame.
4. POSSIBILIDADES DE
FRACIONAMENTO DO OBJETO
A partir da realização do orçamento, que
muitas vezes ocorre com a participação de empresas atuantes no mercado em que
são oferecidos os bens ou serviços de interesse da Administração, pode ser
identificado com maior precisão se existe maior conveniência na contratação de
todos os produtos ou serviços com uma única empresa ou se é viável o fracionamento
do objeto em diversas pequenas parcelas, de modo que cada uma possa ser
ofertada por um interessado diferente.
Este fracionamento deverá observar as
condições econômicas e técnicas da contratação que se pretende realizar, e
deverá ser norteada pelos seguintes elementos: o maior fracionamento aumenta,
potencialmente, o universo de possíveis fornecedores, ampliando a
competitividade, entretanto, por outro lado, possibilita a ocorrência de
conflitos de responsabilidade entre estes diferentes fornecedores.
Um exemplo ilustra a situação: considerando a
contratação de duas empresas, uma para fornecer peças e outra para realizar os
serviços de mão de obra, ambas com a função de realizar a manutenção de
veículos oficiais. Caso o reparo não ocorra de acordo com o esperado, existirá
uma dificuldade em identificar qual o contratado responsável pelo equívoco, e,
enquanto isso é apurado, o veículo pode ficar sem condições de uso,
prejudicando o serviço público.
Estes elementos devem ser observados no
momento em que há a definição do projeto, e posteriormente reforçados quando da
orçamentação, e definirão elementos importantes relacionados à forma de
identificação da proposta mais vantajosa, como se verá adiante.
5. ELEMENTOS DE QUALIFICAÇÃO
Como afirmado acima, a licitação é um
instrumento de promoção da igualdade, e igualdade não consiste em dispensar o
mesmo tratamento a todos, mas em dispensar tratamentos iguais àqueles que estão
em mesma condição e desiguais àqueles que estão em condições desiguais.
Juridicamente, a promoção de desigualdades é
absolutamente corriqueira, mas para que seja viável, o critério para que a
desigualdade seja identificado deverá ser razoável; em seara de licitações,
estes critérios são dados pelos elementos atinentes à habilitação dos interessados
no certame, parcialmente definidos de modo direito pela norma, e parcialmente
deixados para uma decisão discricionária da Administração Pública.
Assim, os elementos de qualificação jurídica,
relacionados à regularidade da operação empresarial em questão, são todos
disciplinados em norma, diretamente. A empresa deverá manter os registros e
livros que sejam compatíveis com seu ramo de atividade, estar adequadamente
inscrita perante os órgãos da Administração Tributária, sempre que assim
determinar a legislação de regência da atividade, e estar em situação regular
perante todos estes.
Aqui, busca-se identificar a regularidade da
situação da empresa, não necessariamente a sua adimplência perante o fisco. Há
diversas situações em que o pagamento não se verificou e a situação permanece
regular, mas é imperioso que tenham sido prestadas as declarações
correspondentes à atividade, sob pena de inviabilizar a participação da empresa
no certame.
Assim é porque não é possível considerar em
situação de igualdade a empresa que se apresenta ao Fisco e recolhe o que lhe é
exigido daquela que simplesmente se omite em relação a suas obrigações de
caráter tributário, esta seria uma situação de desigualdade intolerável pelo
sistema jurídico.
Superada esta questão fundamental, cabe
investigar as condições de o interessado efetivamente cumprir as obrigações que
decorrerão do futuro contrato. Tal necessidade se apresenta por força da
atração que os contratos com a Administração exercem em relação aos agentes de
mercado: são, normalmente, contratos de vulto, mas é comum que os interessados
não tenham a exata dimensão a respeito do volume de encargos que lhes será
demandando.
Assim, com base nas atividades anteriores da
empresa será verificado se esta tem a capacidade de atender à demanda da
empresa; estes elementos podem ser de ordem técnica ou operacional, e
corresponderão não a todos os elementos constantes do futuro contrato, mas
àqueles que sejam considerados chaves, chamadas de parcelas de maior
relevância.
Tais parcelas de maiores relevância devem ser
identificadas técnica e motivadamente, e correspondem aos elementos que
demandam maior capacidade do interessado em contratar com a Administração,
aquelas que são efetivamente estratégicas para o cumprimento do futuro contrato.
Aqui é importante observar que haverá
nulidade se os elementos de qualificação técnica forem muito baixos, visto que
a segurança da contratação será colocada em xeque, bem como se estes elementos
estiverem exacerbados, visto que a competição será frustrada.
6. VIABILIDADE DA COMPETIÇÃO
E INTERESSE PÚBLICO EM SUA OCORRÊNCIA
Uma vez estabelecido o projeto, verificada a
compatibilidade orçamentária da futura contratação e identificadas as
qualidades que deverá ostentar aquele que pretender ser contratado pela
administração, é possível identificar, de modo preciso e em função do caso
concreto, se há viabilidade de competição e, ademais disso, se há efetivo
interesse público em sua instalação.
A possibilidade de que seja realizada uma
competição efetiva entre os potenciais interessados é pressuposto lógico da
realização de um certame, de uma competição entre estes, e quando inexistente
dá ensejo à figura da inexigibilidade de licitação, reconhecida pelo art. 25 da
Lei 8.666/93, que prevê expressamente o afastamento do certame quando esta
situação se verifica.
É importante observar que as hipóteses
previstas expressamente no texto da norma, a saber: exclusividade de
fornecimento, contratação de artistas e contratação de profissionais técnicos
especializados, são exemplificativas, ou seja, não contemplam todas as situações
em que o instituto poderá ser aplicado.
Essa conclusão jurídica decorre de uma
situação prática, histórica, e não jurídica: é inviável identificar todas as
situações em que a competição será inviável, mas é importante registrar que
diante dessa inviabilidade haverá a afastamento do certame, por meio da aplicação
da inexigibilidade de licitação.
Os mesmos efeitos da inexigibilidade decorrem
da dispensa – ou seja, não há realização de competição entre os interessados – porém
com fundamentos bastante diversos: nas situações em que este conceito é
aplicável a competição é viável, mas esta é afastada por outras razões de
interesse público. Diferentemente do que ocorre com a inexigibilidade, que não
consiste em opção do legislador, mas de uma situação de fato que torna inútil a
instauração do certame, a dispensa é algo que depende da previsão expressa da
lei para poder ser aplicada.
As questões que determinam a dispensa vão
desde o baixo valor dos futuros contratos, que não justificam a adoção de
providências onerosas – tanto no que diz respeito ao custo direto quanto no
comprometimento das estruturas da administração – previstas para o processo de
licitação, até razões relacionadas com a intenção da administração em fomentar
determinadas atividades, ou ainda o reconhecimento de que o tempo de realização
do certame não prejudique o próprio interesse público que se pretende atender
pela contratação.
Não cabe, no presente texto, a análise de
todas as situações de dispensa, que estão previstas no art. 24 da Lei nº
8.666/93, mas convém analisar duas hipóteses que estão, certamente, entre as
que mais chamam atenção daqueles que precisam aplicar a legislação de regência
das licitações e contratos, a saber: a dispensa por emergência e a dispensa em
função do valor.
A dispensa em função do valor não apresenta,
inicialmente, maiores demandas de investigação, considerando-se apenas que as
aquisições abaixo de determinado valor não dependerão de certame; ocorre,
entretanto, que podem decorrer graves nulidades e eventualmente até práticas
infracionais mais graves da circunstância de haverem sucessivas dispensas para
contratações que poderiam ser licitadas em um determinado conjunto.
Com efeito, é evidente a preocupação do
legislador em evitar que sejam realizados procedimentos onerosos com vistas a
economias ínfimas, mas a repetição das dispensas, caso supere o valor previsto
em lei dentro de determinado exercício, pode demonstrar um fracionamento
irregular das aquisições com vistas a evitar o procedimento e burlar o
princípio licitatório.
Assim, registrando a necessidade de que as
aquisições sejam planejadas, e havendo a constatação de que as quantidades
necessárias de determinados bens ou serviços são inferiores a determinado valor
(pode-se trabalhar com R$ 8.000,00 como referência) pelo período de um ano, não
haverá utilidade efetiva com a realização do certame, eis que o custo do
procedimento superará a potencial economia.
A determinação de que exista dispensa depende
a possibilidade de que sejam identificados potenciais blocos de contratos (por
exemplo, material de escritório ou de limpeza, em que cada item com muita
frequência implicaria demanda inferior ao limite acima mencionada, mas que
podem ser adquiridos em blocos, atingindo o limite em que a licitação é
perfeitamente exigível).
Assim, é necessário, para a aplicação regular
desta dispensa, que o bem ou serviço seja necessário em quantidade tal, no
período de um ano, que, ainda que associada sua aquisição ou contratação com
outros de mesma natureza não seja atingido o valor preconizado pela legislação.
Tal conclusão somente é possível diante de uma situação em que as aquisições
estejam adequadamente planejadas.
A questão da dispensa em função da
emergência, por sua vez, demanda ainda mais atenção, eis que frequentemente é
considerada irregular pelos órgãos de controle por falhas que são, em verdade,
antecedentes ao processo de aquisição que se analisa. A explicação para esta
situação é a seguinte: caso não exista adequado planejamento das aquisições, a
situação emergencial decorreria da
falta da adequada programação das compras, e não seria aplicável o permissivo
legal para afastar a competição.
Assim, devemos observar mais este elemento
que reforça a necessidade de planejamento como parte fundamental dos processos
de licitação: caso a situação dita emergencial seja criada por falhas no
andamento de processos no interior da administração ou ainda por planejamento
equivocado, o processo estará fadado à irregularidade.
Devemos, então, considerar que a adequada
instrução de um procedimento como este, deverá partir da demonstração de que a
Administração envidou, a tempo e modo, observados todos os elementos atinentes
à ordinária contratação de serviços ou aquisição de bens, os esforços que são
necessários ao atendimento das demandas que lhe são apresentadas, mas que, por
razão imprevisível, ou ainda previsível de consequências imprevisíveis, tais
medidas não foram suficientes para atender aos interesses públicos que estão
sob a responsabilidade da Administração.
A partir desta demonstração, deverá estar
consignado no processo que o adiamento da contratação pelo prazo necessário ao
certame (de cinco a trinta dias, de acordo com a modalidade do certame,
conforme será exposto adiante) implica a inviabilidade de que seja atendido, de
modo efetivo, o interesse público que determina a contratação.
Assim é, por exemplo, nas situações em que há
calamidade pública, em que a vida e os bens das pessoas ficam em risco em
decorrência de situações extraordinárias decorrentes de inundações ou
solapamentos; nessa situação não é possível aguardar o procedimento
licitatório, é imperioso que os bens estejam disponíveis de modo mais célere do
que aquele que permitira o certame.
Aqui, entretanto, deve ser identificadas as
medidas preventivas adotadas pela administração com vistas à preparação da
demanda. Com efeito, é comum que existam chuvas bastante fortes em janeiro,
estas chuvas, de modo ordinário, provocam algumas situações em que a
Administração deve intervir, assim, a necessidade de intervenção, para
justificar a emergência, deverá ser além daquela que seria razoável prever em
função do que a expediência revela nos períodos anteriores.
7. DETERMINAÇÃO DA
MODALIDADE DE CERTAME
Caso os bens a serem adquiridos ou os
serviços a serem contratados não estejam incluídos nas situações verificadas
acima, deve haver a preparação da fase competitiva, do certame, que ocorrerá de
acordo com procedimentos definidos na legislação federal – que trata das normas
gerais – e também de acordo com as normais locais atinentes a cada uma das
esferas de administração.
Uma breve observação a respeito dessa matéria
deverá ser realizada, ainda que a legislação federal seja bastante minuciosa, é
possível que existam determinações nas normas locais que façam com que os
procedimentos aumentem sua compatibilidade com os princípios norteadores dessa
atividade administrativa.
Assim, são admissíveis as alterações que
determinem maior publicidade dos instrumentos de convocação ou que restrinjam
as possibilidades de utilização de modalidades que prevejam formalidades
menores com vistas a assegurar o cumprimento dos objetivos jurídicos dos
certames licitatórios.
Feitas tais observações, devemos enfrentar as
questões atinentes às modalidades. A Lei nº 8.666/93, traz três modalidades de
licitações voltadas à aquisição de bens e contratação de serviços, a saber:
convite, tomada de preços e concorrência, colocados em ordem crescente de
complexidade. A definição da modalidade ocorreria, no modelo desta norma, de
acordo com o valor da contratação – quanto maior o valor, maior a complexidade.
Aqui, cabe uma observação: deve ser
considerado, para a identificação do valor, a quantidade de serviços que sejam
passíveis de fornecimento por um mesmo prestador de serviços ou comerciante,
adotando-se a modalidade compatível com o valor global da contratação a ser
empreendida.
Esta observação é muito relevante visto que
existe na legislação de regência uma orientação no sentido de que sejam
fracionadas as parcelas da contratação, observada a viabilidade econômica e
técnica, mas, entretanto, este parcelamento não poderá implicar a adoção de
modalidade de licitação que seja mais simples do que aquela que é destinada ao
conjunto de bens ou serviços que se pretende adquirir.
A partir do valor deverá ser identificada a
modalidade, conforme tabela constante do art. 23 da Lei nº 8.666/93, as
alterações entre as modalidades estão relacionadas ao padrão de publicidade a
ser adotado e ao prazo que deverá ser observado entre a conclusão das medidas
de publicidade e a data previstas para a abertura do certame, que variam entre
5 (cinco) e 45 (quarenta e cinco) dias.
A partir da publicação do edital, observado o
prazo de publicidade compatível com a modalidade (este prazo poderá sempre ser
dilatado por decisão administrativa, nunca inferior ao preconizado por lei),
serão recebidos os envelopes com os documentos relacionados à habilitação e às
propostas dos interessados, em sessão pública.
Abre-se, então, os documentos atinentes à
habilitação e esta é avaliada pela comissão de licitação, conforme os elementos
constantes do edital, decidindo-se, de modo motivado, quanto à habilitação dos
interessados e abrindo-se prazo para interposição de recursos.
Resolvidos os recursos administrativos em
relação à habilitação, ressalvada a existência de alguma determinação judicial
em sentido contrário são restituídos os envelopes com as propostas dos
interessados inabilitados ainda fechados e abertos, em sessão pública, os
envelopes das empresas habilitadas.
Os servidores responsáveis pelo processamento
da licitação avaliam as propostas, a fim de identificar se as mesmas estão de
acordo com os padrões estabelecidos no ato de convocação e procedem à
classificação daquelas que atendam aos requisitos legais de acordo com os
critérios definidos no edital, declarando a desclassificação daquelas que não
contemples os elementos preconizados no projeto licitado.
Abre-se, então, novo prazo para eventuais
impugnações, e, posteriormente os autos são encaminhados à autoridade superior
àquelas que processaram o certame para que sejam verificados os termos do
procedimento licitatório, a fim de que, se atendidas todas as determinações
legais aplicáveis, seja homologado o certame.
Posteriormente à Lei nº 8.666/93, foi
instituído, por meio da lei nº 10.520/02, o pregão, que consiste em uma
modalidade de licitação destinada a aquisição de bens e serviços comuns, assim
entendidos aqueles que possam ser descritos de acordo com padrões habitualmente
previstos no mercado.
Esta modalidade de licitação deverá ser
precedida de edital tornado formalmente público 8 (oito) dias úteis antes da
data prevista para a recepção das propostas e poderá ser utilizada
independentemente do valor previsto da contratação.
Ademais, como alteração relevantíssima em
relação ao modelo da Lei nº 8.666/93, há a previsão de inversão das fases do
procedimento, analisando-se, assim, em primeiro lugar, as propostas comerciais
dos interessados, que poderão, ao contrário do que ocorre no rito da Lei nº 8.666/93,
ser chamados a participar de um leilão invertido, reduzindo os preços originalmente
lançados em suas propostas.
Após a identificação da proposta mais
vantajosa se afere as condições de habilitação daquele interessado que a
apresentou. As vantagens do procedimento estão relacionadas à celeridade e à
redução do volume de trabalho e de incidentes desnecessários, considerando-se
que apenas a habilitação do licitante vencedor deverá ser analisada.
Esta modalidade ainda poderá ser realizada
por meio de instrumentos da tecnologia da informação, por meio do que se
convencionou chamar pregão eletrônico, o que amplia ainda mais a
competitividade eis que reduz os custos envolvidos na participação na
licitação.
8. EDITAL
Sem que adentremos nos detalhes e
peculiaridades de cada modalidade de licitação, observar que o edital de uma
licitação é um elemento fundamental para seu sucesso – tanto sob o ponto de
vista da regularidade quanto sob o ponto de vista da compra de materiais que
apresentem todas as qualidades que são esperadas pela administração.
Os editais devem apresentar todos os
elementos que permitam ao interessado aferir, com segurança, os encargos que
devem ser suportados caso venha a se sagrar vencedor do certame, ou seja,
deverá conter todos os elementos relacionados à descrição do objeto a ser
licitado, de acordo com os limites que foram descritos acima.
Ademais disso, deverá deixar absolutamente
claro quais são os elementos que serão necessários para a qualificação dos
interessados, sem que implique, sob qualquer hipótese, a restrição indevida do
universo de proponentes, o que implicará nulidade.
Também deverá o edital prever qual o critério
para aferição da proposta a ser declarada vencedora, observando-se aqui que não
poderá se limitar a falar simplesmente em menor preço, visto que é possível
aferir o menor preço dos itens considerados globalmente, em lotes parciais ou
isoladamente; tal informação deverá estar lançada de modo claro, assim como
deverá estar claramente colocada a utilização de critério técnico, quando
admitido.
Qualquer omissão quanto ao critério ou a
utilização de qualquer critério que deixe de ser impessoal macula o procedimento.
Finalmente, o procedimento deverá ser
realizado de modo que assegure a todos os interessados o contraditório e a
ampla defesa, também sob pena de nulidade.
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