Por: Ilo Jorge
Especialista em Gestão
Pública e Política.
Com a instituição do Código de Trânsito Brasileiro - CTB em 23 de janeiro de 1.998, os órgãos de trânsito passaram por uma remodelagem no âmbito de suas competências.
A grande diversidade de
situações, costumes ou a própria configuração da malha viária
brasileira, fizeram com que a responsabilidade de fiscalizar o
trânsito urbano ficasse mais focada nos Municípios. Com a
incumbência dos Departamentos Municipais de Trânsito para assumir a
atividade de fiscalizar suas respectivas circunscrições,
esperava-se que a regionalização destas responsabilidades viesse a
dinamizar o processo de correção de atitudes no trânsito.
Portanto, com a distribuição das 245 infrações de trânsito previstas no CTB, 63 ficaram sob a competência do Estado, 166 do Município e 16 tipos de infrações ficaram para ambos, sendo chamada de competência solidária, ou seja, do Estado e do Município conjuntamente, como determina a Resolução nº 66/98 do Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN.
Até então, tudo perfeito. Ainda mais que o Art. 22 do CTB elenca as competências do Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN e de igual modo o Art. 23 do CTB ampara as atribuições da Polícia Militar, mediante convênio firmado com os órgãos executivos, assim como o Art. 24 do CTB promulga as competências municipais de autuação.
Em síntese, as infrações relativas à regularização documental do veículo ou do condutor são de alçada do Estado e as infrações atinentes ao uso do solo, como circulação, parada ou estacionamento são atribuídas ao Município.
Apesar de a maior incumbência ter sido atribuída ao Município para exercer a função de fiscalizar e autuar as infrações de trânsito em sua circunscrição, este precisa, obrigatoriamente integrar-se ao Sistema Nacional de Trânsito – SNT, como preceitua o próprio Art. 24 § 2º do CTB, devendo também cumprir a Resolução nº 296/08 do CONTRAN, dispondo de estrutura organizacional de engenharia de tráfego; fiscalização e operação de trânsito; educação de trânsito; coleta, controle e análise estatística de trânsito, e dispor também de Junta Administrativa de Recursos de Infrações – JARI.
Com a distribuição de competências em questão, constata-se uma incongruência, onde o Agente de trânsito do município flagra o cometimento de uma infração de alçada do Estado e nada poderia fazer, a não ser ficar olhando o infrator ir embora impunemente. O mesmo acontecia com o Agente Estadual de Trânsito no tocante às infrações de competência municipal.
Eis que surge o Art. 25 do CTB estabelecendo o seguinte:
Os órgãos e entidades
executivos do Sistema Nacional de Trânsito poderão celebrar
convênio delegando as atividades previstas neste Código, com vistas
à maior eficiência e à segurança para os usuários da via.
Art. 25. do CTB.
Sendo assim, organizam-se três órgãos principais de fiscalização de trânsito: o Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN, detém as competências do Estado, que por força do Art. 23 § 3º do CTB delega poderes de fiscalização do trânsito urbano à Polícia Militar via convênio.
O Departamento Municipal de Trânsito, devidamente integrado ao SNT podendo fiscalizar as infrações de competência municipal através de Agentes de Trânsitos próprios ou delegá-las à Polícia Militar mediante convênio permitido pelo supracitado artigo .
Para dirimir estas questões um tanto quanto confusas, é essencial um tríplice convênio de reciprocidade, a exemplo da cidade do Cabo de Santo Agostinho no Estado de Pernambuco, donde o DER-PE delega suas competências ao BPRV – Batalhão de Polícia Rodoviária e a Secretaria Municipal de defesa Social, através da Gerência de Trânsito e Transportes - GTT, todos de forma solidária, ou seja, o órgão delegante continua exercendo a fiscalização e as autuações, conjuntamente com o órgão delegado, exceto os atendimentos e registros de acidentes de trânsito, que segundo o convênio, fica arrogado à Gerência de Trânsito e Transportes - GTT.
Todavia, percebemos que os instrumentos de Convênio são fundamentais para a adequação das atividades, mas é prudente ressaltar o cuidado na elaboração e no entendimento destas delegações, pois não se delega responsabilidades. Mesmo que um órgão do Sistema Nacional de Trânsito - SNT transfira suas competências de fiscalização e de autuação, os Agentes deverão utilizar nos autos de infrações o Código do Órgão Autuador delegante, caso contrário a Resolução nº 66/08, perderia sua razão de existir. Ademais, o infrator precisa saber onde entrar com os recursos, vez que a Junta Administrativa de Infrações - JARI do órgão delegante é a responsável pelas deliberações.
Em suma, com o Convênio de Reciprocidade firmado, qualquer Agente de trânsito dos respectivos órgãos poderão atuar e autuar em todos os tipos de infrações, inclusive utilizando blocos unificados, desde que seja mencionado o Código do Órgão Autuador conforme a competência originária imposta pela Resolução nº 66/08, do Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN.
Atualmente o fator mais preocupante é a omissão dos demais municípios em integrar-se ao Sistema Nacional de Trânsito - SNT, o que causa uma lacuna na fiscalização do trânsito urbano dos respectivos municípios, no tocante àquelas infrações de competência municipal.
Algumas Prefeituras pactuam que basta firmar Convênio com a Polícia Militar e tudo estará resolvido, não precisando fazer investimento na estrutura organizacional exigida pela Resolução nº 296/08 do CONTRAN. Mero engano, pois o Departamento Municipal de Trânsito só poderá delegar competências que possui, adquiridas com a integração ao Sistema Nacional de Trânsito - SNT.
Outro paradigma a ser vencido pelos gestores municipais é a visão de que a estruturação organizacional do Departamento Municipal de Trânsito - DMT seja custo e não investimento, haja vista que existe um aumento da receita através de percentual sobre valor das multas aplicadas. Sobretudo, os municípios poderão juntar-se na formação de consórcios públicos para a integração conjunta ao Sistema Nacional de Trânsito - SNT, amparados pela Lei Federal nº 11.107 de 6 de abril de 2007, bastando apenas uma estrutura para atender aos consorciados. Além disso, depois de criados os respectivos setores, apenas o de fiscalização de trânsito poderá ser delegado à Polícia Militar.
Convênios e papelórios à parte, o certo é que a atuação dos órgãos públicos de fiscalização de trânsito é limitada, face à carência de recursos humanos e materiais. Chegamos a um ponto em que cidadãos e sociedade precisam educar-se e fazer a sua parte. Acredito que a mobilização em prol da correção de atitude no trânsito, seja o único caminho em busca da utópica paz no trânsito.
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