Para
cada jovem de 13 a 25 anos que morre assassinado, o Brasil perde
cerca de R$ 550 mil. Em 20 anos, o país teve um prejuízo acumulado
de mais de R$ 450 bilhões devido ao elevado número de homicídios.
A
conclusão é de um estudo inédito da Secretaria de Assuntos
Estratégicos do governo federal, obtido com exclusividade pela
Folha. A pesquisa calculou quanto custou a criminalidade para o país
no período de 1996 a 2015.
No
caso dos homicídios, o valor se refere à perda da força produtiva,
ou seja, quanto o Brasil deixa de ganhar com os frutos que o trabalho
de cada vítima renderia. Para calcular o valor que o país
desembolsou por causa da violência, o relatório mensurou os gastos
do setor público e privado em seis áreas: segurança, seguros e
danos materiais, custos judiciais, perda da capacidade produtiva,
encarceramento e serviços médicos e terapêuticos.
Em
2015, a criminalidade custou 4,38% do PIB brasileiro, o que equivale
a aproximadamente R$ 285 bilhões. De 1996 a 2015, os recursos
destinados à segurança pública subiram expressivamente (162%, em
valores corrigidos pela inflação). Contudo, o estudo defende que
eles não foram aplicados de maneira eficiente, visto que o país não
conteve o avanço do crime.
Segundo
o estudo do governo, em razão da Lei do Teto de Gastos (que limita o
aumento dos gastos federais à inflação do ano anterior) e da
situação fiscal delicada da maioria dos estados, não é viável
aumentar expressivamente o valor empregado na segurança.
Assim,
o documento sugere uma revisão da política de seguridade
brasileira, de modo a desenvolver estratégias baseadas em evidências
empíricas ou seja, investir recursos em ações planejadas e com
forte chance de retorno.
O
pesquisador de violência da USP Leandro Piquet afirma que, apenas
com mudanças na gestão da segurança pública, muito pode ser
feito. "Hoje, na minha visão, o principal problema é a baixa
produtividade dos recursos que temos.
Temos
muito policial empregado e poucos na rua. Muito policial civil e
pouca gente investigando".
Para
Robert Muggah, cofundador do Instituto Igarapé e colaborador do
estudo, quando avaliadas, as políticas de segurança brasileira
levam em conta critérios equivocados. "Em vez de medir a
redução dos índices criminais, os policiais são recompensados
pelo número de prisões e pela quantidade de crack que apreendem.
Em
vez de serem recompensados por processar e prender criminosos
violentos, promotores e juízes são recompensados pelo número de
suspeitos encarcerados.
O
foco está errado", diz. Para mudar o contexto atual, o
relatório do governo sugere que a liberação de recursos seja
condicionada à realização de avaliações consistentes sobre as
ações.
NO
NORDESTE, ARMAS COMUNS SÃO AS QUE MAIS MATAM
A
pistola calibre 38, de origem nacional como a roubada do militar em
1º de abril, está entre as armas mais apreendidas no Nordeste,
segundo levantamento inédito do Instituto Sou da Paz.
O
estudo, obtido pelo GLOBO com exclusividade, mostra que as armas de
cano curto (57% a 99%, a depender do estado pesquisado), com calibres
permitidos (74% a 96%) e de fabricação nacional (76% a 95%) foram
as mais recolhidas pelas forças de segurança nos nove estados do
Nordeste no ano de 2015.
Em
geral, são armas que começam no mercado legal, nas mãos de
policiais e de agentes de segurança privada, e acabam no ilegal —
por acidente ou má-fé. O resultado da pesquisa mostra que o combate
ao crime e à violência, no Nordeste ou em todo o país, depende não
apenas da repressão ao tráfico internacional de armas, que coloca
no mercado nacional armas de grosso calibre, vindas do exterior e
compradas por facções criminosas.
Depende,
em grande medida, de evitar o desvio das armas menores. “O perfil
encontrado contradiz o senso comum, de que a arma que mata é o fuzil
que vem de fora do país, proveniente do tráfico internacional.
Não
é esse tipo de arma que realmente ameaça a população”, diz
Natália Pollachi, coordenadora de projetos do Sou da
Paz. Compreender o tipo e a origem das armas que matam numa
região recordista em assassinatos é essencial para direcionar
políticas públicas de prevenção e controle.
Com
o tema da segurança pública em evidência, não raro candidatos à
Presidência prometem afrouxar as leis contra o armamento como forma
de reduzir a insegurança. Recentemente, o pré-candidato do PSL,
deputado Jair Bolsonaro, disse que “a arma, mais que a defesa da
vida, é a garantia da nossa liberdade”.
Em
maio, numa feira de agricultura familiar no entorno de Brasília,
Bolsonaro prometeu distribuir fuzis para cada produtor rural. Um dia
depois, o ex-governador Geraldo Alckmin, pré-candidato à
Presidência pelo PSDB, admitiu facilitar o porte de arma para a
população das áreas rurais, caso seja eleito.
A
coleta de dados da pesquisa junto aos nove estados nordestinos durou
seis meses e foi obtida por meio da Lei de Acesso à Informação. O
Instituto Sou da Paz reuniu dados de 14.404 armas de fogo das 28.637
apreendidas em 2015. Alagoas e Ceará foram os destaques positivos no
que diz respeito à qualidade das informações. Bahia, Pernambuco e
Sergipe foram o lado negativo: não forneceram nenhum dado à
pesquisa.