domingo, 7 de junho de 2020

MANDATO COLETIVO OU MANDATO COMPARTILHADO


Ezequiel Vanonni/Divulgação

AS JUNTAS EM PERNAMBUCO NAS ELEIÇÕES DE 2018

Em política, Mandato Compartilhado ou Mandato Coletivo é uma forma de exercício de cargo eletivo legislativo, em que o representante se compromete a dividir o poder com um grupo de cidadãos. Enquanto em um mandato tradicional o legislador tem a liberdade de votar de acordo com seus interesses e consciência, no mandato coletivo o legislador consulta as pessoas antes de definir seu posicionamento frente a matérias legislativas. Assim, a vontade das pessoas determina o posicionamento e voto do legislador.

No Brasil, o mandato coletivo ou compartilhado não é oficial. Ele é exercido a partir de um acordo informal entre o parlamentar eleito e o grupo que o apoia, onde o parlamentar é candidato. Isso porque, apesar de não haver impedimento, "a legislação eleitoral trata a candidatura como um ato individual".
O Mandato Compartilhado tem sido utilizado em diversas culturas, continentes e finalidades por todo o mundo. Destaca-se, as seguintes experiências:
  • No Brasil, a primeira proposta foi em 1999, do então estudante de sociologia da UERJ Marco Fonseca da Costa que propôs um mandato coletivo mediado por computadores. Ele concorreu em 2009 pelo Partido Verde do Rio como “cyber vereador “. Ele criou os termos sub-vereador e Co-vereador. Leonardo Secchi junto com mais 472 cidadãos denominados Co-Deputados, concorreram nas eleições de 2014, para o cargo de Deputado Estadual no Estado de Santa Catarina, como membro da Rede Sustentabilidade, na ocasião um partido político ainda não registrado pelo Tribuna Superior Eleitoral Brasileiro que recebeu apoio do Partido Socialista Brasileiro (PSB) para que seus membros pudessem disputar a eleição. O Mandato Compartilhado proposto foi aberto para inscrição de qualquer cidadão do Estado. O registro permaneceu disponível até uma semana antes do dia de das eleições. A permanência de Co-Deputados foi baseada na assiduidade em reuniões online (em mídia social). A iniciativa previa que cada Co-Deputado teria a mesma proporção do poder de voto utilizando a regra da maioria através de um sistema de votação baseado na Web (Sistema de Mandato Compartilhado - SMC).
  • O projeto alcançou 8.010 votos e não foi suficiente para obter um mandato na referida eleição. Ainda no Brasil, em 2016, um grupo de cinco pessoas em Alto Paraíso de Goiás fez campanha de forma coletiva e conquistou uma cadeira na Câmara de Vereadores, com 148 votos. O advogado João Yuji foi o candidato formal, compartilhando o mandato com turismólogo, jornalista e guia turístico Ivo Anjo Diniz, a bióloga Laryssa Galantini, Luiz Paulo Veiga Nunes (engenheiro industrial e analista de sistemas) e Cesar Adriano de Sousa Barbosa (químico).
A pesquisa realizada em 2017, mostra, além das citadas acima, 45 iniciativas de inovação na democracia considerando mandatos coletivos ou compartilhados em diversas regiões do mundo. A mesma pesquisa mapeou 14 experiências em andamento no Brasil.
Em Pernambuco
A candidatura das Juntas surgiu com esse mesmo objetivo. Formado por 5 (cinco) mulheres, o grupo conquistou 39.175 votos e se elegeu pelo PSOL. "Se cada uma saísse sozinha, a gente não teria força. Então decidimos pela candidatura coletiva", conta Joselita Cavalcanti, vendedora ambulante e militante do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) no Recife.
Representante oficial do mandato, Jô Cavalcanti será a voz e o "dedo" das Juntas nas decisões, brinca a "codeputada" eleita Robeyoncé Lima.
"Mas ela não vai apertar nenhum botão para aprovar ou reprovar projetos sem antes conversar com a gente e com os movimentos sociais que nos apoiam", afirma Robeyoncé, advogada e ativista LGBT — ela foi a primeira advogada trans a ter o direito de usar o nome social na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em PE. "A gente quer fazer um mandato participativo. Seremos apenas uma ponte entre os movimentos sociais e o espaço de tomada de decisão."
Se cada uma saísse [candidata] sozinha, a gente não teria força. Então decidimos pela candidatura coletiva.Joselita Cavalcanti, das Juntas.
Sem garantias legais aos demais "codeputados", a confiança mútua é imprescindível para o bom funcionamento do mandato coletivo. Para que todos possam ter o mesmo papel na atuação legislativa, a ideia é que os integrantes do grupo sejam contratados como assessores parlamentares das deputadas eleitas de fato.

Nesse modelo, a soma dos salários seria dividida em partes iguais. No caso da Bancada Ativista, o coletivo também estuda doar uma parte do valor recebido todos os meses para ONGs e movimentos sociais.
JUNTAS
Carolina Vergolino, jornalista
Joelma Carla, estudante
Joselita Cavalcanti, ambulante e militante do MTST
Kátia Cunha, professora
Robeyoncé Lima, advogada e ativista LGBT
No que diz respeito às decisões, ambos os grupos se dizem preparados para lidar com a divergência até chegar a um consenso.
"É salutar que existam opiniões distintas. E a gente vai conversar tranquilamente até criar uma convergência. Acho que vai ser tranquilo, até porque nós já fazemos isso na militância diária", afirma Jô, das Juntas. "A gente pretende chegar ao consenso sem precisar fazer votação. Esse modelo de votação é muito antigo, e nós estamos em um momento de renovação", completa.

ELEMENTOS BÁSICOS DE MANDATOS COMPARTILHADOS

Como iniciativa de atuação dos cidadãos no processo de formulação de alternativas e de tomada de decisão no enfrentamento de problemas públicos - em especial, a formulação de leis, os mandatos compartilhados implicam no compromisso do representante legislativo de compartilhar o poder com um grupo de cidadãos.
O acordo básico do representante é a estrita obediência ao posicionamento da maioria do grupo de representados sobre o que se deve decidir no parlamento. Dessa forma, a vontade do grupo determina o posicionamento e voto do legislador.
OS ELEMENTOS BÁSICOS DE UM MANDATO COMPARTILHADO SÃO:
1. Parlamentar: o ator político que administra e ocupa legalmente um assento legislativo, sacrificando a autonomia política a favor dos co-parlamentares;
2. Co-Parlamentar: grupo de cidadãos que participam de um mandato coletivo para influenciar coletivamente, e até mesmo determinar a posição do parlamentar na votação plenária e/ou ao exercer outras atividades legislativas; e,
3. Estatuto do Mandato Compartilhado: é um acordo ou carta de intenção capaz de delimitar aqueles que podem participar, o número mínimo e máximo de membros, os procedimentos adotados pelo grupo, as obrigações e deveres de cada um, etc.

ELEMENTOS ESTRUTURANTES EM MANDATOS COMPARTILHADOS

Os elementos estruturantes na identificação dos Mandatos Compartilhados são:
1. Iniciativa. Onde surgiu a iniciativa da adoção do Mandato Compartilhado. Algumas opções possíveis são: por iniciativa do político, do partido político ou de um grupo de cidadãos.
2. Tamanho do grupo envolvido. Um Mandato Compartilhado pode ser composto de dois ou até milhões de cidadãos.
3. Elegibilidade. A forma de seleção dos co-parlamentares é importantíssima. Algumas formas de seleção podem se dar por conhecimento especifico, por filiação partidária, por idade, por território, todos podem ser elegíveis.
4. Acesso. O momento de entrada em um Mandato Compartilhado pode variar. Os co-parlamentares podem aderir ao Mandato Compartilhado antes do registro da candidatura, durante a campanha eleitoral, durante o interstício entre o dia da eleição e a diplomação, durante o mandato, ou a qualquer tempo.
5. Permanência. Tal como o acesso, o processo de expulsão é relevante. Algumas possibilidades de exclusão podem ser baseadas na assiduidade, na demonstração de esforço, no desempenho, na ética etc.
6. Distribuição do poder. Como é distribuído o peso do parlamentar em face aos co-parlamentares sempre deverá ser claramente definido, visto que pode se dar 1% a 100% do poder de decisão.
7. Análise de matérias. O tipo de matérias que são objeto de votação em um Mandato Compartilhado é item relevante. Pois o custo de informação e de tempo das pessoas envolvidas pode determinar se há desejo de discutir apenas algumas propostas legislativas que chegam ao plenário ou todas as matérias da rotina legislativa.
8. Partilha de custos e benefícios. Deve-se definir como e por que motivo são e distribuídos os custos de campanha e as verbas de gabinete de um Mandato Compartilhado.

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