A Guarda Municipal e sua competência para autuar por infração de trânsito
|
|
Por Paulo Marques |
RESUMO:
O presente artigo tem como objetivo abordar sobre um dos pressupostos
de validade do ato administrativo de autuar por infração de trânsito,
qual seja o sujeito do ato, mais especificamente dos agentes das Guardas
Municipais. A problemática reside na competência dos agentes da Guarda
Municipal poderem emitir "autos de infração" de trânsito, em função de
suas competências definidas na Constituição e de acordo com a
interpretação da jurisprudência e da doutrina administrativista.
PALAVRAS CHAVE: Guarda Municipal - Auto de Infração de Trânsito - Competência
A doutrina tradicional do ato administrativo, onde se enquadra a
autuação por infração de trânsito e também a penalidade por infração de
trânsito, tem sua expressão no art. 2º , Incisos da Lei
4.717, de 29 de junho de 1965, que por sua vez é uma ampliação dos
próprios elementos do ato civil. A lei da Ação Popular orienta a
doutrina ao estabelecer cinco "pontos" que, se violados pela
Administração, legitimariam qualquer do povo para intentar ação
constitucional em defesa do interesse público visando à anulação do ato.
Assim, são vários os doutrinadores que desenvolveram suas
doutrinas acerca dos elementos que constituem o ato administrativo com
base no art. 2º da Lei da Ação Popular. Destacam-se: Hely Lopes Meirelles e Maria Sylvia Zanella Di Pietro.
A teoria tradicional dos cinco elementos do ato
administrativo parecia se ajustar perfeitamente a atos simples ou
singulares, mas não a atos complexos e dependentes de um processo (ou
procedimento) administrativo.
Outros são os esgotamentos da doutrina tradicional dos
cinco elementos, como, por exemplo, confundir em um mesmo elemento
forma, formalidades e procedimento e, também, dar tratamento único ao
motivo do ato, causa e a sua motivação.
Celso Antônio Bandeira de Mello, em seu Curso de Direito
Administrativo, ampliou a doutrina tradicional ao criticar uma ligação
"reducionista" entre a Lei da Ação Popular e os elementos do ato
administrativo, mas sem, contudo, em sua teoria, deixar de abarcar todos
os elementos daquela doutrina, com maior rigor de detalhamento e sem a
preocupação em repetir a lei.
1.1 Doutrina tradicional dos elementos do ato administrativo
Para a doutrina tradicional, o ato administrativo possui cinco elementos básicos, que têm sua exteriorização no art. 2º da Lei da Ação Popular que, conforme Hely Lopes Meirelles[1] são: competência, objeto, forma, motivo e finalidade.
Em verdade, a teoria tradicional dos elementos do ato administrativo
formou-se pela ampliação dos elementos do ato jurídico do Direito Civil,
atualmente previstos pelo art. 104 do Código Civil (Lei 10.406, de 10
de janeiro de 2002).São requisitos de validade dos negócios jurídicos,
segundo o art. 104 do Código Civil: "I - agente capaz; II - objeto
lícito, possível, determinável ou determinado; e III - forma prescrita
ou não defesa em lei."
Sobre a matéria, o autor argentino Juan Carlos Casagne afirma:
En esta materia, si bien la estruturacción de una teoria acerca de
los elementos del acto administrativo no debe desconocer los principios
que informan la categoria del acto jurídico en la teoria general del
derecho, lo cierto es que resulta imprescindible tener en consideración
las peculiariedades propias de la disciplina publicística en que aquélla
se desenvuelve. [2]
Para Casagne, os elementos essenciais do ato administrativo são:
sujeito, causa, objeto, forma e finalidade. A crítica de Celso Antônio
Bandeira de Mello se fundamenta no fato de que não pode ser elemento
(parte de um todo) algo de natureza diversa do próprio ato.
Não há que se falar, portanto, que a doutrina tradicional dos cinco
elementos, seguida por Hely Lopes Meirelles, Maria Sylvia Zanella Di
Pietro, Juan Carlos Casagne, Odete Medauar, entre outros é infundada,
incorreta ou mesmo ultrapassada. Afinal, todos os autores tratam o ato
administrativo de forma diversa do ato ou negócio jurídico civil,
apontando os pressupostos, requisitos ou elementos que diferenciam um e
outro, havendo apenas muitas divergências terminológicas e enfoques
diferenciados.
1.2 Doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello
Pela doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello, o ato
administrativo se divide em dois elementos (Conteúdo e Forma),
garantidos por pressupostos de existência (objeto e função
administrativa) e de validade (sujeito, motivo, requisitos
procedimentais, finalidade, causa e formalização):
O pressuposto subjetivo do ato administrativo de autuação ou
penalidade por infração de trânsito é o ponto mais polêmico do Código de
Trânsito Brasileiro. É o primeiro elemento do ato administrativo na
doutrina tradicional e um pressuposto de validade na doutrina de Celso
Antônio Bandeira de Mello.
O pressuposto subjetivo do ato administrativo tem que ser analisado
em duas linhas: a) competência legal do órgão e do agente que produziu o
ato e b) capacidade civil, impedimentos e suspeições do agente como
pessoa física. Nessa linha de pensamento, exemplifica Celso Antônio
Bandeira de Mello:
Sob este tópico - atinente ao sujeito - deve-se estudar a capacidade
da pessoa jurídica que o praticou, a quantidade de atribuições do órgão
que o produziu, a competência do agente emanador e a existência ou
inexistência de óbices a sua atuação. Por exemplo: se o agente não
estava afastado (por suspensão, férias, licença) ou impedido (por
parentesco próximo, por temporária suspensão de sua competência).[3]
Outrossim, Celso Antônio Bandeira de Mello critica a teoria
tradicional do ato administrativo, que classifica o sujeito como
elemento do ato, visto que, por condição lógica, "... quem produz um
dado ser não se confunde nem total nem parcialmente com o ser produzido
(...). Verifica-se, pois, que o sujeito é exterior ao ato."[4]
Ainda, sobre a utilização do termo "sujeito" e não "competência",
conforme previsto na Lei da Ação Popular (Lei 4.717, de 29 de junho de
1965), Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma "... com relação à competência é preferível fazer referência ao sujeito, já que a competência é apenas um dos atributos que ele deve ter para a validade do ato ..."[5]
Refere-se Di Pietro ao fato de que o agente não necessita apenas de
competência legal, mas também tem que possuir capacidade para o ato
administrativo. Ocorre que, em se tratando de atos vinculados, é
irrelevante a capacidade civil do agente, como observa Celso Antônio
Bandeira de Mello: "É notório o exemplo de ato vinculado praticado por
servidor louco e que, apesar disto, é válido se expedido nos termos em
que teria que sê-lo."[6]
2.1 A competência no âmbito do Código de Trânsito Brasileiro
Segundo o CTB, as competências entre os órgãos do Sistema Nacional de
Trânsito (SNT) estão distribuídas da seguinte forma, conforme a tabela
abaixo:
ÓRGÃOS DO SNT
|
COMPETÊNCIA
|
DISPOSITIVO LEGAL CTB
|
CONTRAN
|
Órgão máximo coordenador, consultivo e normativo (regulamentador). Órgão julgador (última instância recursal em casos específicos). |
Art. 12
|
DENATRAN (Órgão máximo executivo de trânsito)
|
Órgão máximo executivo, supervisor e coordenador. Órgão de suporte técnico, financeiro, administrativo e jurídico do CONTRAN. |
Art. 19
|
CETRAN/CONTRANDIFE
|
Órgãos normativos, consultivos e coordenadores. Órgãos julgadores em última instância. |
Art. 14
|
JARI
|
Órgãos julgadores (1ª instância). |
Art. 17
|
DNIT (Órgão executivo rodoviário da União) Departamentos de estradas (Órgão executivo rodoviário estadual/DF ou municipal)
|
Fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas administrativas, arrecadando valores de multas. Fiscalização de controle veicular ambiental. No caso municipal, restrita ao excesso de peso, dimensões e lotação (art. 24, VIII do CTB). |
Art. 21
|
DETRAN (Órgão executivo estadual de trânsito ou DF)
|
Fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas
administrativas, arrecadando valores de multas (Exceto Art. 24, VII e
VIII do CTB). Fiscalização de controle veicular ambiental. |
Art. 22
|
DEMUTRAN (Órgão executivo municipal de trânsito)
|
Fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas
administrativas, arrecadando valores de multas para infrações de
circulação, estacionamento e parada (Art. 24, VII do CTB). |
Art. 24
|
Polícia Rodoviária Federal
|
Patrulhamento ostensivo de trânsito. Aplicar penalidades e medidas administrativas e arrecadar multas e valores. Fiscalização de controle veicular ambiental. |
Art. 20
|
Polícia Militar
|
Policiamento ostensivo de trânsito. Agente dos órgãos executivos de trânsito e executivos rodoviários, mediante convênio. |
Art. 23, III e Anexo I
|
Como se pode extrair do quadro acima, dentre os órgãos que podem
autuar e/ou aplicar penalidades por infração de trânsito encontra-se o
Departamentos Municipais de Trânsito (órgão executivo municipal de
trânsito): por vezes denominados de DEMUTRANs, que são novidade em
relação ao Código Nacional de Trânsito (revogado) e decorrem da intenção
manifesta em se municipalizar o trânsito. Esses órgãos têm competência
para fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas
administrativas, arrecadando valores de multas para infrações de
circulação, estacionamento e parada (art. 24, VII do CTB).
2.2 Competência de agentes e autoridades de trânsito municipais
A competência na área de direito de trânsito e aplicação de
penalidades de é de natureza material e territorial. Material visto que
tal sujeito é competente para atuar apenas em matérias legalmente
previstas e territorial, posto que a competência é fracionada pelos
diversos órgãos para atuarem na sua área de jurisdição.
A competência em relação à matéria é expressa, quando é
reservado aos órgãos executivos municipais autuar as infrações de
trânsito de circulação, estacionamento e parada (art. 24, VII do CTB).
A Resolução 66 do CONTRAN, de 23 de setembro de 1998,
dispõe sobre a distribuição de competência entre os órgãos executivos de
trânsito, manejando as competências estaduais e municipais (ou
concorrentes) através de uma tabela de correlação entre o órgão
competente e a infração de trânsito tipificada.
Quanto à "jurisdição" ou competência territorial, a mesma
se opera no trânsito pelo aspecto territorial do ente federado para os
órgãos executivos de trânsito municipais, cujo território será o
Município.. Deve-se observar, ainda,o aspecto da "jurisdição sobre a
via" entre os órgãos executivos rodoviários e a Polícia Rodoviária
Federal, onde a competência se repartirá nas estradas e rodovias
municipais, estaduais ou distritais e federais.
Sobre o agente ou autoridade de trânsito, disciplina o Código de trânsito Brasileiro, em seu Art. 280, ipsis literis:
Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:
(...)
§ 2º A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou
do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por
equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio
tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN.
(...)
§ 4º O agente da autoridade de trânsito competente para lavrar o auto
de infração poderá ser servidor civil, estatutário ou celetista ou,
ainda, policial militar designado pela autoridade de trânsito com
jurisdição sobre a via no âmbito de sua competência.
Entretanto, quem é o agente da autoridade de trânsito?
Segundo o Anexo I do CTB é "...pessoa, civil ou policial militar,
credenciada pela autoridade de trânsito para o exercício das atividades
de fiscalização, operação, policiamento ostensivo de trânsito ou
patrulhamento." Assim, o agente da autoridade de trânsito é aquele que
detém a credencial da autoridade que lhe reveste da competência
necessária para autuar infrações de trânsito.
Já foi abordado, em princípio, que o agente tem que estar devidamente
designado, e isso inclui a verificação de suas suspeições e
impedimentos, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, o que retira a
competência de agentes afastados da função, por qualquer motivo: folga,
licença, férias, etc. A função administrativa exige investidura plena,
não sendo dever do agente agir quando não estiver em exercício pleno de
suas funções.
Outra questão relevante é que, apesar de o CTB se referir
singelamente à "pessoa civil credenciada pela autoridade", há uma
limitação para que se delegue ou credencie agentes de entidades privadas
para autuar infrações, visto que tal função é estritamente pública o
que decorre da própria competência legal de cada órgão do SNT. Toda
competência é irrenunciável, afirmando Hely Lopes Meirelles que "... a
competência administrativa, sendo um requisito de ordem pública, é
intransferível e improrrogável pela vontade dos interessados"[7].
De fato, repassar competência estatal para iniciativa privada, está
mais para renúncia que para delegação e implica na impossibilidade
jurídica de se transferir, por exemplo, a competência para autuar por
estacionamento irregular às administradoras de parquímetros e vagas em
via pública.
Emitido o auto de infração compete à autoridade de trânsito aplicar a
penalidade (art. 281, CTB). Autoridade de trânsito, segundo o Anexo I
do CTB é o "... dirigente máximo de órgão ou entidade executivo
integrante do Sistema Nacional de Trânsito ou pessoa por ele
expressamente credenciada."
Com isso resta evidente e clara a ilegalidade de aplicação de
penalidade de multa por infração de trânsito pelo agente da autoridade,
como ocorria recentemente com os Autos da Polícia Rodoviária Federal que
se exteriorizavam por uma Notificação de Penalidade conjugada com
boleto bancário de pagamento. Sobre a matéria manifestou-se, inclusive, o
Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL - STJ 464815 / SC
ADMINISTRATIVO. MULTA POR INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. ATRIBUIÇÃO PARA APLICAR PENALIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. DESRESPEITO.
- Reserva-se à autoridade de trânsito competência de aplicar
penalidades de trânsito (CNT, art. 281).- Ao agente que constata a
prática de ato ilícito, cabe apenas lavrar o respectivo auto e dele
intimar o infrator.
- A aplicação imediata da multa pelo agente de trânsito desrespeita o
contraditório e a ampla defesa, pois retira do suposto infrator a
oportunidade da defesa prévia. Precedentes.
3. A GUARDA MUNICIPAL E SUA COMPETÊNCIA PARA ATUAR NA FISCALIZAÇÃO DE TRÂNSITO
A Constituição Federal estabelece de forma singela a atuação das
guardas municipais, segundo o § 8.º do art. 144, inserido no Capítulo da
Segurança Pública e no Título da da defesa do Estado e das Instituições
democráticas que: "Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei."
Conforme define a própria Constituição, a competência das Guardas
Municipais deverá ser disposta em lei, obviamente lei municipal, por
observância mesmo ao princípio federativo, onde cada ente federativo
deve tratar sobre a composição e competências de seus órgãos
administrativos.
Trata-se de interpretação extensiva com fundamento no princípio da
autonomia federativa contidos nos arts. 1.º e 18 da Constituição
Federal, como bem observa a colega Christiane Vasconcelos, que em seu
artigo diz:
O disposto no artigo 144, § 8º, da Constituição Federal, não pode ser
abordado fora da autonomia municipal, haja vista que as normas devem
ser interpretadas no seu conjunto, principalmente, quando se trata de
normas constitucionais, como é o caso em tela. É indiscutível a
autonomia dos Municípios, motivo pelo qual seria incoerente acreditar
que a organização e as atribuições da Guarda Municipal fossem
"engessadas" em um dispositivo insusceptível de interpretação extensiva,
somente sendo passível de mudanças por emenda constitucional. O ínsito
no referido artigo tem ampla possibilidade de ser interpretado
extensivamente, por não ser taxativo, assim como acontece com outros
dispositivos constitucionais,como bem lembrou Rosenira Santos, ao citar o
artigo 133[8].
Todavia, tem criado polêmica quando atuam os órgãos municipais
através das Guardas Municipais, na área de trânsito, especialmente,
autuando por infração de circulação, parada e estacionamento de
veículos.
A questão não está unificada nos Tribunais pelo país, como se observa
pelas decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e de São
Paulo, verbis:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. GUARDA MUNICIPAL. RESTRIÇÃO CONSTITUCIONAL. A Guarda Municipal
não pode exercer serviços de trânsito nem, mesmo conveniada, exercer
segurança pública, restringindo sua ação à defesa civil.
Inconstitucionalidade parcial. Votos vencidos (ADI n. 592052088, de
Porto Alegre, rel. Des. Délcio Antônio Erpen, j. 21-12-1992).
Ação direta de inconstitucionalidade dos arts. 1º, "caput" (parcial) e
parágrafo único, incisos I e II, 5º (parcial) da Lei n. 2003, de 2 de
abril de 1991, do Município de Capivari, que conferem à Guarda Municipal
atribuições privativas da Polícia Militar e da Polícia Civil do Estado ¿
Ofensa aos arts. 1º, 139, "caput", §§ 1º a 3º, 140 a 142, 144 e 147 da
Constituição do Estado ¿ Ação julgada procedente (ADI n. 78.746-0/0, de
São Paulo, rel. Des. Paulo Franco, j. 3-4-2002).
E, assim como no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
as decisões no Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina são
díspares, como se depreende dos julgados abaixo transcritas:
GUARDA MUNICIPAL. COMPETÊNCIA PARA EXECUTAR A
FISCALIZAÇÃO DE TRÂNSITO, AUTUAÇÃO E APLICAÇÃO DE MEDIDAS
ADMINISTRATIVAS POR INFRAÇÕES DE CIRCULAÇÃO, ESTACIONAMENTO E PARADA.
CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO,ART. 24, VI. DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIAS
ENTRE OS ESTADOS E MUNICÍPIOS NA RESOLUÇÃO DO CONTRAN N. 68/98.
INFRAÇÕES DA COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO QUE AUTORIZAM APENAS A APLICAÇÃO
DAS PENALIDADES DE ADVERTÊNCIA E MULTA.
(...) há que se reconhecer a possibilidade de fiscalização do
trânsito pelos Guardas Municipais, dentro das competências que são
conferidas ao Município no Código de Trânsito Brasileiro (Lei n.
9.503/97): (...) Assim, a Guarda Municipal pode fiscalizar e autuar os
infratores no trânsito, desde que, é claro, sejam as infrações de
circulação, estacionamento ou parada. (Apelação Cível n. 2007.057085-2
de Itajaí, relatoria do Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva)
Já em outra linha, mas em medida cautelar:
CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. INCISOS IV E V
DO ART. 1º E INCISOS II E III DO ART. 9º DA LEI COMPLEMENTAR N. 135/2006
DO MUNICÍPIO DE LAGUNA. COMPETÊNCIA DA GUARDA MUNICIPAL PARA AUTUAR
INFRATORES DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO E DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL.
APARENTE INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. ATRIBUIÇÃO TÍPICA DA POLÍCIA
MILITAR. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 107 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL E 144, §
8º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA
DEMONSTRADOS. CONCESSÃO DE MEDIDA CAUTELAR. EFEITOS PARA O FUTURO.
(Tribunal Pleno TJSC, ADI n. 2008.045151-7, de Laguna, sob a relatoria
do Des. Luiz Carlos Freyesleben).
O certo é que caberá ao Supremo Tribunal Federal dirimir tal questão
de forma definitiva e o tema se encontra desde 2009 para ser julgado,
sendo admitida a sua repercussão geral. Acredtita-se, que, pelo
princípio da autonomia municipal, o Pretório Excelso decida pela
constitucionalidade da atuação das Guardas Municipais na fiscalização de
trânsito, com especial competência para autuar por infração de trânsito
de circulação, parada e estacionamento, segundo competência material
definida pelo art. 24, Inciso do Código de Trânsito Brasileiro.
Tal decisão seria a mais acertada, em que pese as opiniões
contrárias, posto que bastaria aos Municípios criarem cargos de agentes
de trânsito junto aos órgãos municipais de trânsito e teriam estes a
competência para atuar no trânsito, da mesma forma, salvo a
impossibilidade de cuidar dos bens e prédios públicos municipais, os
quais podem ser bem cuidados e com custo bem inferior, por vigilância
privada contratada por processo licitatório.
Ou seja, mesmo pela lógica interpretativa não é possível manter à
Guarda Municipal competência restrita ao que dispõe o art. 144, § 8.º da
Constituição Federal, sendo mister concluir pela constitucionalidade e
legalidade de sua atuação na área de trânsito, desde que prevista tal
competência na lei municipal de criação, com fulcro no que dispõe o art.
24, Inciso VII c/c 25 e 280, § 4.º do Código de Trânsito Brasileiro.
A competência das Guardas Municipais prevista na Constituição da
República Federativa do Brasil, em seu art. 144, § 8.º, deve ser
interpretado de forma extensiva, com a observância aos disposto nos
arts. 1.º e 18, que tratam da autonomia dos entes federativas,
destacando-se o Município como ente novo inserido pelo Constituinte
originário.
Desta forma, a própria Constituição prevê que a Guarda Municipal pode
ser criada pelos Municípios e sua competência seja definida em lei. Não
podendo a União ou os Estados intervirem na autonomia municipal,
trata-se de lei criada pelo município, que poderá incluir outras
competências legalmente admitidas, sob pena de redução da competência
das guardas a um mero e custoso serviço de vigilância e proteção
patrimonial, que pode ser contratado por simples processo licitatório
local.
Florianópolis, 25 de agosto de 2010.
PAULO EUCLIDES MARQUES, advogado e editor-chefe da Revista Transitar, publicação especializada em trânsito.
[1] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27.ª ed., São Paulo: Malheiros: 2002, p. 146.
[2] CASAGNE, Juan Carlos. El acto administrativo. 2.ª ed., Buenos Aires, Abeledo:Perrot: 1981, p. 182.
[3] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 15.ª ed., Malheiros,
São Pualo: 2005, p. 363.
São Pualo: 2005, p. 363.
[4] Idem.
[5] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Curso de Direito Administrativo. 13.ª ed., São Paulo: Átlas, 2001, p. 187.
[6] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 366.
[7] MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 147.
[8] Vasconcelos, Christiane. (2009). Guarda Municipal como Agente de Trânsito. Acesso em 25 de agosto de 2010, disponível em http://guarda.dourados.ms.gov.br/Default.aspx?Tabid=74&ItemID=243
Nenhum comentário:
Postar um comentário