Embora os problemas
urbanos sejam múltiplos no contexto das cidades brasileiras, optou-se por
destacar a questão dos resíduos sólidos, uma vez que este tema está na pauta da
grande maioria dos governos locais brasileiros. Não é possível, em poucas
linhas, aprofundar sobre o tema – e por isso, sugere-se a leitura atenta da
legislação em vigor – mas o objetivo aqui é apontar alguns aspectos principais.
Inicialmente, é
interessante lembrar que desde os anos 90, já havia debates no Congresso Nacional
sobre a questão da coleta, tratamento e destinação dos resíduos produzidos pela
sociedade. No entanto, esta agenda torna-se muito mais concreta no governo Lula4.
Em 2004, por exemplo,
foi criado um Grupo Interministerial para debater o tema. O Conselho Nacional
do Meio Ambiente (CONAMA) também teve papel fundamental, promovendo debates e
seminários. E em 2007, o projeto de lei começou a tramitar no Congresso, onde
foi aprovado em 2010.
Então, a Lei
12.305/2010 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, definindo
princípios, objetivos e instrumentos, e também as diretrizes relativas à gestão
integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos5. Além disso, na Lei estão
previstos mecanismos de responsabilização dos geradores de resíduos sólidos e a
obrigatoriedade de serem criados os Planos Estaduais de Resíduos Sólidos e os
Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, com a realização de
diagnósticos e estabelecimento de metas de redução, reutilização e reciclagem,
entre outros conteúdos mínimos.
Vale destacar o
parágrafo 1o do artigo 18 da Lei que estabelece que para ter acesso prioritário
aos recursos da União, os Municípios que: optarem por soluções consorciadas
intermunicipais para a gestão dos resíduos sólidos, incluindo a elaboração e
implementação de plano intermunicipal, ou que se inserirem de forma voluntária
nos planos microrregionais de resíduos sólidos; implantarem a coleta seletiva
com a participação de cooperativas ou outras formas de associação de catadores
de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa
renda.
Um outro aspecto
fundamental da Política está no Capítulo III, que trata das responsabilidades dos
geradores e do poder público. No artigo 33, torna-se obrigatório a
implementação de sistema de logística reversa por parte de fabricantes,
importadores, distribuidores e comerciantes de: agrotóxicos (incluindo resíduos
e embalagens); pilhas e baterias; pneus; óleos lubrificantes (incluindo
resíduos e embalagens); lâmpadas fluorescentes de vapor de sódio e mercúrio e
de luz mista; produtos eletroeletrônicos e seus componentes.
Os consumidores devem
efetuar a devolução após o uso, aos comerciantes ou distribuidores que, por sua
vez, devem devolver aos fabricantes ou importadores, que são responsáveis pela
destinação ambientalmente correta destes itens. Caso o poder público opte,
mediante acordo setorial formalizado, por cuidar das tarefas previstas para os
fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, ele deverá ser
remunerado por isso.
Experiências
inovadoras
Para Silva (1992), a
leitura dos artigos da Constituição de 1988 permite “concluir pela
possibilidade de o município legislar sobre meio ambiente, suplementado a
legislação federal e estadual, mas também agindo de maneira inovadora” (Silva,
1992, p. 93.). Passados mais de 20 anos deste texto e
com os novos ordenamentos jurídicos criados e também com as experiências acumuladas,
é possível lembrar algumas experiências exitosas em diferentes locais do país e
que até hoje podem servir como inspiração para gestores públicos.
Parceria nos Morros
O Programa Parceria
nos Morros foi criado em 1994 pela Prefeitura do Recife, tendo como objetivo “prover
formas alternativas de contenção de encostas, assim como uma maior participação
do beneficiário no planejamento e na execução das obras, partindo da premissa
de que essa participação poderia ampliar a identificação destes com as
intervenções, aumentando o índice de preservação das obras” (PRADO, 2006, p.
138). Em 2009, Recife tinha aproximadamente 3.000 pontos de risco, monitorados
pela Defesa Civil e classificados, de acordo com o Plano Municipal de Redução
de Riscos, entre risco 1 (menor) e risco 4 (maior).
O projeto prevê
parceria entre técnicos governamentais, responsáveis pelos projetos de
engenharia e para garantir que condições sociais permitam a realização da obra,
e a comunidade local, que executa a obra, com mão de obra familiar ou
contratada. Os resultados indicados pela prefeitura, em 2009, apontavam para
mais de 3.000 frentes concluídas e mais de 8.700 famílias beneficiadas pelas
ações de construção de obras de contenção das encostas.
Cooperativas de Catadores de Materiais Recicláveis
O artigo 8o. da
Política Nacional de Resíduos Sólidos estabelece que entre os instrumentos da
política está o “incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de
outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e
recicláveis”. No entanto, muitas cooperativas de catadores existem há vários
anos no Brasil. A Coopamare (Cooperativa de Catadores Autônomos de Papel,
Papelão, Aparas e Materiais Reaproveitáveis), por exemplo, em São Paulo foi
criada em 1989 com o apoio de várias entidades vinculadas à Igreja Católica e
teve uma parceria fundamental para a sua consolidação, durante o início da
gestão Luiza Erundina. Embora a Coopamare enfrente disputas constantes, muitas
delas relativas à localização da sua sede, seu trabalho ainda serve como
inspiração.
Outra experiência
inspiradora é a ASMARE (Associação dos Catadores de Papel, Papelão e Material
Reaproveitável) de Belo Horizonte. Formalizada pouco tempo depois da Coopamare,
em 1990, esta iniciativa dos catadores teve apoio fundamental da Pastoral de
Rua da Arquidiocese de Belo Horizonte. Em 1993, no início da gestão Patrus
Ananias, a Asmare consolidou- se como ator fundamental dentro da política de
limpeza urbana da capital mineira.
Mas mais do que isso,
houve um trabalho da prefeitura para sensibilizar a população sobre a importância
da coleta seletiva e o trabalho do catador, enquanto agente ambiental6. Ao
longo desses anos, a Asmare desenvolveu muitas atividades – até mesmo de lazer –
que permitiram a ampliação das perspectivas profissionais e pessoais para os
catadores e seus familiares.
Consórcios Intermunicipais: resíduos sólidos e bacias hidrográficas
Os Consórcios
Intermunicipais vêm ganhando cada vez mais importância em diversos assuntos. No
entanto, na área ambiental, eles são essenciais. Em termos de destinação de
recursos sólidos, como a coleta e o tratamento de lixo7 possuem alto custo, uma
boa solução para municípios de pequeno e médio porte é a parceria com
municípios vizinhos em busca de alternativas conjuntas e que podem ser mias
eficientes economicamente e eficazes socialmente.
No caso dos recursos
hídricos, esta articulação é ainda mais urgente. Isto porque, os rios nascem em
alguma cidade, cruzam outras e desaguam em outras. Ou seja, caso o rio não seja
cuidado corretamente em um determinado município, outra localidade sofrerá as consequências.
Na primeira década
deste século, duas experiências catarinenses chamaram a atenção: o Consórcio
Quiriri e o Consórcio Lambari. Embora estas experiências de articulação
intermunicipal sejam sempre complexas – nos dois casos citados, os desafios
foram muito grande – é importante conhecer iniciativas que produziram bons
resultados para inspirar e também para aprender com os desafios enfrentados.
Construção de parques
Conforme mencionado
nas aulas anteriores, pouquíssimas cidades brasileiras foram planejadas adequadamente.
Com isso, os chamados “espaços verdes” são cada vez mais escassos nas cidades
de médio e grande porte. No entanto, isso é um equívoco do ponto de vista
ambiental e também de saúde, já que além de melhorar a qualidade do ar, estes
espaços podem tornar-se áreas destinadas à prática de atividades físicas e
esportivas.
A construção de
parques (ou mini-parques) não é fácil em cidades com alta densidade
populacional. Mas os gestores públicos precisam enfrentar essa questão e para
isso, há os instrumentos previstos no Estatuto das Cidades. Algumas gestões,
por exemplo, têm utilizado a desapropriação de prédios, antigos galpões
industriais ou casas para aumentar a cobertura vegetal dos municípios e assim,
aumentar a qualidade de vida dos cidadãos.
Um alternativa, em menor
escala, pode ser a distribuição de mudas de árvores frutíferas da região para a
instalação de pomares caseiros. Essa iniciativa, além de possibilitar a
melhoria na qualidade nutricional das famílias, promove o auto abastecimento de
frutas e pode colaborar com a arborização da cidade. Em Belo Horizonte, por
exemplo, em 1994 foi criado o projeto Pró-Pomar que serviu como referência para
outras localidades.
Texto do Prof. Fernando
Burgos
Com adaptação de Ilo Jorge –
Especialista em Gestão Publica.